sexta-feira, 30 de março de 2018

Fight Club

Que melhor que uma sexta-feira santa para ingressar no Fight Club. Acordei por volta das 6:30 am. É impressionante como nos dias feriados continuamos com os padrões avassaladores que nos são impostos nos dias de trabalho. Sobretudo em horários contratura como estes. Acordei angustiado em posição fetal, numa atitude defensiva perante o mundo que me rodeia. Levantei-me, bebi dois ou três cafés e regressei à cama. Levantei-me, fumei dois ou três cigarros e regressei à cama. Levantei-me, fui à casa de banho e regressei à cama.  Não conseguia parar quieto. A angústia invadia-me todos os capilares e colocava o meu pensamento em numa ebulição incontrolável. Que melhor dia para finalmente ingressar no Fight Club. Levantei-me definitivamente, desci a correr os três andares das escadas de madeira podre. Abri a porta envelhecida de madeira verde perfurada pelos pequenos raios de sol que iluminavam fracamente o hall mal-cheiroso daquele prédio da rua poço dos negros. Peguei na minha bicicleta enferrujada e deslizei colina abaixo ao encontro da morada que recebi por sms de um número obscuro. Poucas pessoas andavam na rua. E aquelas que andavam tiveram uma noite difícil. Por pouco escorregava na pintura de vomitado que decorava a calçada decrépita. Encontrado o meu destino bati a porta e esperei 4 minutos até que finalmente alguém se dignou a responder. Expliquei-lhe a estória do sms. Seguiu-se uma pausa desconfortável. Queria muito ingressar no Fight Club. Mandaram-se subir e aguardar à porta. Não apreciei. Enviaram-me um sms que não pedi. Pedi informações que me foram facultadas. Mandaram-me subir e agora tratam-me como um cão sarnento, sem dignidade para esperar no hall de entrada que fosse. Queria muito entrar no Fight Club mas há limites para a agressão. Quando finalmente alguém se dignou a abrir apareceu-me um indivíduo moreno, de fraca estatura, com um sorriso pepsodêntico que denotava o profissionalismo do técnico de próteses dentárias que lhe havia adornado aquela boquinha pequenina de lábios finos. Sempre odiei lábios finos. Claro que, e várias vezes disse, generalizar é um ode à estupidez humana, mas nunca conheci ninguém de lábios finos que fosse de confiança ou valesse a pena ser das minhas relações. Normalmente são fuinhas. Olhei-o de alto a baixo e algo no ser me irritou. Talvez o facto de me ter recebido de roupão e de pantufas. Apeteceu-me esmurrá-lo. Talvez esse seja o objectivo do Fight Club. Perguntou-me se tinha sido recomendado por alguém. Respondi-lhe que não, que tinha recebido um sms. Então lamentava imenso mas não poderia passar da porta de entrada. Não era digno de ingressar no Fight Club. Era um Club exclusivo e que só depois de recomendado e passado pelo crivo moral por onde se rege o regulamento poderia ter acesso ao processo de iniciação, que envolvia aventais, sacrifício de animais vadios e sodomia intelectual. Apeteceu-me novamente esmurrá-lo. Quem era aquele ser pequenino para se arrogar de fazer parte do Fight Club e vir com exigências processuais. Ri-me nas fuças do indivíduo não sem antes lhe responder "Fuck You Very Much". Era o que mais faltava ser enxovalhado por aquele pequeno réptil peçonhento. Desci as escadas novamente e regressei à rua. Tinha chuvido e o Sol agora reflectia-se no piso escorregadio que se iluminava a cada passo meu. Ao meu lado a bicicleta enferrujada. Entrei na Leitaria da Lapa e deleitei-me com um belo abatanado e crumble de maçã. Chegaste entretanto e contei-te a minha estória da manhã. Sorriste e simplesmente me disseste que no Fight Club não entra quem quer, só quem é convidado. E que se calhar não te acharam digno de fazeres parte de tão exclusivo clube. Fervi novamente. Levantei-me e fui à casa de banho antes de voltar para a cama.










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