Hoje estive perto de ti. Passei nesse bloco cinzento e envidraçado onde trabalhas. Imaginei-te no teu fato verde igual ao meu mas em ti melhor. Vi-me reflectido e apercebi-me que as lágrimas me escorriam. Imaginei-te enclausurada como eu. Mas essa foi a vida que escolhemos. Nunca me arrependi. De facto amo o que faço. Faz-me sentir humano, mais humano. Estive perto de ti sem saber se lá estavas. É pouco importante. Na realidade já nem sequer tem sentido. Tudo não passa já de memórias que se vão distorcendo na minha mente. Escrevo quando devia estar a preparar a aula de amanhã. Mas a tua imagem invade o meu pensamento. Estou a um passo de voltar à grupanálise. Esta obsessão não me larga. E no entanto é tão somente amor, paixão, um sentimento inominato. Na realidade nem sequer já sei é a ti que eu amo. A ti ser palpável. Nem sei se te reconhecerei quando eventualmente te vir. Deixaste de existir porque deixei de existir para ti. Podia ter chegado a Lisboa mais cedo. Mas enfiei-me pelo caminho que fazes diariamente na esperança de nos cruzarmos, de te ver escondida no teu pequeno carro cinzento. Apreciei as montanhas verdes ao longe. Recordei os nossos passeios na Regaleira. Parecem tão distantes esses passeios que dávamos e tu com as tuas amigas para a tua mãe não se meter na tua vida. Vejo as fotos que tirámos. Estava gordo e disforme e tu mesmo assim dizias-me amar. Nunca me senti tão bem, tão amado, tão querido, tão compreendido. Como foi possível que tudo se dissolvesse. Demorei o dobro do tempo a chegar a casa. Os meus pensamentos vaguearam à tua volta. Não te vi. Observava todos os carros que por mim passavam na esperança de estares num deles. Hoje estive perto de ti. E no entanto tão longe. Esta obsessão tem que me abandonar. Continuo preso mesmo não querendo. Devolve-me a chave do meu coração. Peço-te. Liberta-me. Vi-me reflectido e só nesse momento me apercebi que chorava por ti.
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