sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Dead People Walking on my Dreams

As pessoas mantêm-se vivas enquanto delas nos recordarmos. Não costumo ligar muito a dias específicos mas hoje é o dia de finados, ou de todos os santos, ou como lhe quiserem chamar. Na realidade devíamos pensar mais vezes em que já partiu. O nosso caminho é esse, sem excepções, desde o mais pobre ao mais poderoso dos seres humanos. A única certeza que temos. O dia e a hora não a escolhemos. Ou bem, até podemos, mas será sempre contranatura. Estava deitado e dei comigo a recordar algumas pessoas. Umas com grande importância na minha vida, outras que não deixaram marcas tão intensas mas com quem me cruzei. 
Cheguei a casa vindo da escola. Sabia que a minha madrinha estava muito doente e que não duraria muito. Que iria para o Céu ou lá o que isso era. Não era a minha verdadeira madrinha, mas sim da minha mãe. Para mim foi uma grande amiga, avó emprestada, quiçá segunda mãe. Sempre que saia em viagem as saudades que guardava dela eram imensuráveis. Trazia-me sempre qualquer coisa guardada na mala beje de pele. Ainda guardo uma t-shirt preta com um tucano carioca. Umas das viagens que fez e me marcaram foi ao Egipto. Uns anos mais tarde corri-o de uma ponta à outra e recordei os momentos, as fotos amareladas guardadas lá por casa. Penso que adquiri o gosto pelas viagens influenciado pela madrinha. Se existirem anjos da guarda a Nanã estará sempre ao meu lado. Senti-o na noite que antecedeu o meu exame de saída. Sabia que estava doente, mas talvez não tenha sido devidamente preparado para a sua morte. Despedi-me dela uns dias antes. Morreu em casa, rodeada pelas pessoas que lhe eram queridas. Quando cheguei a casa a empregada dos meus pais, com uma sensibilidade digna de um calhau musgoso, disse-me a tua madrinha morreu. Recordo-me do choque que foi como se tivesse sido hoje. Há momentos que ficam enraizados para todo o sempre. Esse foi um deles. As memórias visuais que guardo são esbatidas, as espirituais estão bem presentes. Confesso que não consigo perceber se é dela que me lembro ou de todos os milhares de registos do amor incondicional que tinha por mim. Já passaram quase 30 anos e as saudades são muitas. 
Outra morte que me foi especialmente penosa foi a da avó paterna. Estava em plena adolescência e passara a noite de fim-de-ano nos copos, no deboche. Recordo-me de chegar a casa a horas impróprias e encontrar o meu pai choroso que me disse, dorme umas horas e despacha-te que temos que ir para Lisboa - a tua avó faleceu hoje de madrugada no Santa Maria. Só cai em mim quando cheguei ao velório. Olhei à volta e cai em mim. A minha família é de facto envelhecida. Daqui para a frente vão ser um cair de peças de dominó paralelas como se de um jogo se tratasse. Todas as minhas tias e tio paterno já faleceram e alguns do lado materno. É a desvantagem de ser o mais novo da família. Bem, que agora já não sou. A morte da tia Nanda foi especialmente penosa. Essa a minha verdadeira madrinha. Estava de banco nesse dia. O meu pai ligou-me a dizer-me que a tia estava a caminho do hospital numa ambulância do INEM. Tinha alterações do estado de consciência. Quando cheguei ao pé dela, de bata, chamou-me pelo nome de um primo meu. Insisti com a colega da urgência central que lhe pedisse uma TAC CE. A carta enviada pela médica do lar, depositada em cima da mesa, que só li por acaso, fazia referência a uma queda. A colega queria-lhe pedir análises primeiro. Na minha opinião tratava-se provavelmente de um hematoma subdural. Infelizmente, acertei. Foi sujeita a uma trepanação e internada na neurocirurgia. Ainda a vi consciente. Tive tempo para me despedir. Durou poucos mais dias. É impressionante como aquela senhora, sempre impecavelmente bem arranjada que me levava a lanchar à Lua de Mel e à Suiça se possa ter deteriorado tanto. Há mais pessoas em quem penso, a avó pepa, a tia luisa, o tio mario, os meus priminhos tragicamente mortos num acidente na barragem de santa clara, no alentejo, o meu amigo pedro, o meu amigo joão, colegas... mas estou a ficar com um semblante demasiado pesado para continuar a escrever isto. Vou ver um episódio do californication e ver se arrebito.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Comentem o que vos apetecer. Viva a liberdade de expressão!