Estou de saída de banco e por isso mais sensível. É um facto, as saídas de banco são sempre fenómenos de hipersensibilidade, tal como as ressacas. Não obstante aquilo que achamos que é simples e que não nos faz mossa não é bem assim. Quando caiem as defesas as lágrimas vêem atrás. Cheguei a casa, vazia, fria e longe do calor humano que tanto anseio. Os pássaros a única companhia viva nesta véspera de Natal. Passei pela casa dos meus filhotes para lhes dar um beijinho e lhes desejar Feliz Natal. A seguir passei pelo supermercado para comprar algo que se coma. As famílias felizes de fato de treino passeavam-se entre as últimas compras. Eu fiquei-me por um polvo a lagareiro, arroz de pato, 4 sonhos gigantes e uma embalagem de Ben&Jerry´s. E claro está o néctar divino. Que se foda, gastei uma fortuna num Cartuxa para beber sozinho. Deprimente eu sei, pode ser que tenha um efeito hipnótico e me faça adormecer cedo até amanhã de manhã quando todo este inferno natalício tiver passado. Estive a embrulhar os presentes com que vou presentear a minha família. Livros e música, aquilo que mais prazer me dá oferecer e também receber. Esqueçam os perfumes e os pullovers de losangos. Se me querem ver feliz tentem descobrir os meus gostos literários e musicais. O meu Olive debitava The Strokes enquanto os olhos se humedeciam, porque de facto caiu-me a ficha. Posso fingir que não estou triste e sozinho, posso fingir que é um dia como aos outros, mas na realidade sinto-me um farrapo. É nestas alturas que uma pessoa põem questão a nossa própria existência. Se existem amigos, familiares, colegas, se somos queridos ou se a nossa morte passaria em vão após duas ou três palavras de apreço aos mais próximos. Os meus pêsames, sem muito mais a dizer. Doí-me a axila direita, enfiei na cabeça que se calhar tenho mesmo um tumor do pulmão fruto de anos e anos de estupidez. E não deixo de fumar. É inteligente, sobretudo quando vindo de um médico. Quando se chega a um ponto em que a rotina se resume a casa-trabalho-casa devemos repensar a nossa existência. Não podia deixar de escrever. O meu escape, a minha libertação prende-se com estas palavras que poucas pessoas lêem ou apreciarão. Caiu-me a ficha, como já me caiu outras vezes. Mas esta é realmente a primeira vez que passo a consoada sozinho num prédio vazio onde as pessoas foram para santa terrinha em comunhão com as suas famílias. Antes tivesse estado de banco. Aí pelo menos era obrigado a conviver. Com sorte ainda me divertia com os choros dos recém-nascidos neste dia que comemorámos sempre ter a certeza do porquê. Também comprei um presente para ti. Não te vou dar. Mas tenho-o, embora seja teu. Mas isso nunca mais saberás. Hoje caiu-me a ficha e as lágrimas escorrem-me. Acho que vou abrir a garrafa de vinho antes do jantar.
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