Ao longe vejo as luzes cintilantes desta Lisboa que se abate sobre mim no seu descanso irregular. Do alto da minha torre tudo me parece pequeno e distante. As pessoas movem-se como pequenas formigas numa dança aleatória. Os carros de brincar deslocam-se a velocidades estonteantes nesta cidade que amo. Abro a janela e sinto aquele vento que me arrepia. Tenho saudades das noites quentes em que nos debruçavamos sobre esta janela conversando horas a fio. Reclamavas sempre que acendia um cigarro. Hábito nocivo que mantenho e não vejo hora de o largar. Mas não agora, não neste momento, em que a minha única companhia é a incadescência que se apaga entre os meus dedos. A chama do meu desejo , no entanto, mantêm-se viva. Os nossos serões sempre foram acompanhados pela música que nos envolvia. Abria-mos duas ou três coronas e recordávamos os momentos que ainda não tinhamos vivido. Que nunca chegaremos a viver. Hoje penso que esta casa está mais vazia sem ti. Está mais vazia sem mim. Na realidade também já parti. Ao longe imagino o teu quarto de tons esverdados. A Bonsai defunta que te ofereci continua a fitar-te, atrás da tua mesa de trabalho. Provavelmente já te livraste dela. Não passa de um cadáver. Que melhor símbolo para o amor que deixaste morrer. Bastaram sete dias sem alimento, sem a rega adequada. Dentro de menos de vinte quatro horas anseio por um telefonema teu, por uma mensagem. Estou na eterna dúvida se o vais fazer. Na realidade preferia que não o fizesses. Receber uma mensagem impessoal é para mim mais penoso do que não a receber de todo. Desligo as luzes. Só o monitor do meu MacBook velhinho me ilumina a face à medida que o teclo. Esquecemos-nos de tudo até de nós. Hoje alguém me recordou como é triste as pessoas passarem de bestiais a bestas. É estranho como uma união para a vida pode ser votada ao desprezo. As pessoas amam-se até que se banem definitivamente. E aí, é como se nada tivesse acontecido. Até as memórias se esfumam. Alguns, doentes como eu, vão mantendo acesa uma chama artificial. Está condenada à extinção. As pessoas não se amam sozinhas.
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