Acordei com a estranha sensação de viver no passado. Olho á volta e tudo está disposto como se o passado fosse o meu presente caminhando para o futuro. Viver no passado como se de senilidade se tratasse. As mesmas recordações, as mesmas fotos nas molduras, os mesmo objectos, sem que nada tivesse sido mudado. Viver no passado pode ser agradável se o mesmo o foi. Não se envelhece vivendo no passado. Os relógios não avançam. Os calendários estáticos pararam quando fechaste a porta. Acordei, coloquei dois pratos na mesa, sentei-me depois de te beijar e conversei contigo. Combinamos ir ler o "expresso" para "à margem". Como no passado. Discutiamos onde o almoço de Sábado nos levaria hoje. Talvez ir visitar o teu pai. Segui um conselho e liguei-te como no passado. Não atendeste nem respondeste às minhas SMS porque embora eu esteja no passado tu avançaste para o presente. Desfazamo-nos do tempo. Tu continuaste a tua Vida e eu estático congelei num tempo onde o meu pensamento te visita diariamente. Sinto a demência a envolver-me só conseguindo ter acesso às memórias onde tu fazias parte da minha Vida. Essas memórias sinto-as como se de uma realidade se tratasse. É uma das vantagens de se ter Alzheimer. A segunda vantagem é a abolição total do pensamento. Deixamos de ser felizes é certo, mas também deixamos de sofrer. Na realidade deixamos de ser pessoas muito tempo antes do comando do coração falhar. Vivo no passado e sou feliz num filme contínuo.
sábado, 13 de abril de 2013
quinta-feira, 11 de abril de 2013
terça-feira, 9 de abril de 2013
Deitado na minha nossa cama
Deitei-me com sono na nossa cama com os pés para a parede. As máscaras brancas ameaçam cair a qualquer momento. As luzes escarlate projectadas no tecto anunciam 0:40 minutos. O candeeiro de lava move-se ao som da Dave Matthews Band. Hoje em conversa com um amigo afirmei que não conseguia passar um dia sem pensar nela. Ele próprio teve algumas paixões que só o tempo curou. A minha vai em 6 meses e não há meio de me deixar dormir em paz. Apetece-me um cigarro. Assim que acabar de escrever isto vou desactivar o alarme, levantar-me do nosso leito que agora é só meu e mandar uns bafos na cozinha. Escrevo no iPad, a bateria ronda os 41%, mais que suficiente para me iluminar umas horas. Deito-me na diagonal. Já não sei compartilhar os meus lençois. Não sei fazer amor sem ti. Esqueço-me de tudo o que aprendi. O que será feito de ti. Quero-te ligar mas não posso. Perdi o teu número. Passo no corredor e vejo-te na moldura digital sorrindo-me. O drama de nos apaixonarmos por pessoas intelectualmente estimulantes é colocarmos a fasquia muito alto. E o cheiro. Como tenho saudades desse perfume limbico que me invadia. A paixao e isso mesmo. Resume-se a quimica. Ouço uns passos no soalho de madeira que me assustaram. Vou ver o que se passa. Acho que soltei o monstro do alarme. Medo.
segunda-feira, 8 de abril de 2013
e no entanto continuas cá por casa.
E no entanto continuas cá por casa. Passo no corredor e vejo-te a sorrir ao meu lado num fundo Azzuro. As noites de Cabiria. Os candeeiros laranja. O projector Philips de outros tempos. O seu cheiro a óleo. Tudo me fez sentido nessa noite. Há cinemas inesquecíveis. E noites inesquecíveis. A vida é de facto um circolo del artisti. A busca desesperada dos teus ochialli branco e negros espalhados no chão pegajoso de cerveja. Should i stay or should i go. Não ouvia Clash há anos. Não me sentia tão próximo de alguém há anos. E no entanto continuas presente no meu sonho. E cá por casa. E continuamos a passear-nos na via del corso. E a afundar-nos no sake do japonês mais antigo de Roma. A busca desesperada. As pausas. A noite quente e nós flutuando sob o panteão.
quarta-feira, 3 de abril de 2013
always on my mind.
A privação de sono, para além de inúmeras desvantagens, tem o dom de nos tornar hipersensíveis. Nisso os médicos e enfermeiros dão cartas a qualquer profissão. Mesmo quando conseguimos fechar os olhos umas horas mantemos sempre um estado subliminar de alerta que, em última instância, corresponde a estarmos acordados. Quando estes estados de privação de sono são regulares o resultado só poderá ter consequências imprevisíveis. A mente fica menos defensiva, mais frágil e pequenas coisas, pequenas memórias assumem proporções irreais. Seja como fôr, uma delas é a presença diária de pessoas que já desapareceram da nossa vida. Isto é repetitivo e redundante, mas é para isso que escrevo anonimamente (ou quase) num blog. Trata-se de um escape. Dou por mim a pensar em alguém de quem já nada sei. Dou por mim a recordar memórias e momentos que parecem já tão distantes. Dou por mim a pensar diariamente em alguém que já em mim não pensa. Podemos passar por várias relações na nossa vida. Existem umas que nunca nos abandonam verdadeiramente, por bons ou mais motivos. A sabedoria popular afirma que só se cura uma relação frustrada com outra. Nada mais errado. Só se cura uma paixão frustrada com outra paixão. Não estou é certo de nos apaixonarmos verdadeiramente mais do que 2 ou três vidas ao longo da vida. Assim, não há nada mais injusto do que partir para uma relação mais-ou-menos. Não há nada mais injusto do que compararmos outras pessoas aquelas que foram os nossos grandes amores, as nossas grandes paixões. É uma batalha perdida ad initio. Ninguém tem hipótese. E é injusto, mesmo que nunca cheguemos a verbalizar. Nunca pensei passar por isto. Nunca pensei estar fechado desta maneira. Estou condenado à extinção sentimental. Por muito que se racionalize não conseguimos controlar a mente, as saudades, as memórias. Na realidade chega a um ponto em que a própria mente se alimenta deste sofrimento, como se ele fosse essencial a subsistência de uma punição alicerçada em tristeza. Como se pagasse perpétuamente todos os erros e sofrimentos que já infligi. Quando mais tempo passa mais tenho vontade de ligar, de mandar um e-mail, um carta. Mas resisto, porque é importante termos consciência do Fim. E esse já foi definitivo e irreversível. Excepto na minha mente. Esta história que transcrevo não é só minha. Conheço outras semelhantes, de pessoas de quem eu amo verdadeiramente. E o sentimento é o mesmo. Não há um único dia em que o meu pensamento não navegue ao seu encontro, ainda que parcos minutos. Always on my mind. Against my heart.
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