quinta-feira, 7 de março de 2013

regredido a um estado primário do ser

Regredido a um estado primário do ser. E se de repente despisse a minha pele, abandonasse o conforto do lar, me despojasse de todos os meus bens materiais, me libertasse de todas as imposições sociais ao longo de uma vida. E se de repente acordasse num mundo sem regras impostas, sem moralismos, sem meias-verdades, sem meias-mentiras, onde pudesse ser eu mesmo. E se de repente tudo aquilo que é adulterado pelo politicamente correcto desaparecesse do meu ser. E se de repente a profissão, as contas bancárias, as dívidas, os cartões de crédito, os telemóveis, os computadores se eclipsassem. O que seria eu em estado natural, em estado bruto, não moldado por nada nem ninguém. O que seria eu? Como me olharias sem poder, sem dinheiro, sem estatuto, sem nada. Mesmo os homens-santos na longínqua Índia , alheios a tudo o que é material, não conseguem verdadeiramente regredir ao seu estado primário do ser. Desde o momento em que nascemos as influências, por mais frustres que sejam, esculpem-nos, nem que seja uma ínfima partícula. Mas, e se hipoteticamente, eu fosse um ser com uma alma virgem, impoluta, sem o mínimo de maldade, crueldade, egoísmo, onde só sentimentos benéficos eclodiriam, um santo, um jesus-cristo hippie de sandálias agastadas, seria possível sobreviver? Não há pessoas boas ou más. Todos nós temos as nossas fraquezas e os nossos sentimentos negativos. Esta dicotomia entre bem e mal é uma enorme falácia. O cizento é aquilo que nos domina a maior parte do tempo. Alguns no entanto desequilibram a sua balança no sentido das trevas. São os sociopatas deste mundo. A relatividade das características da personalidade de cada um é o que nos mantêm vivos e resistentes às investidas dos outros. Mas, voltando à hipótese da tábua rasa, como será que me olharias? Amar-me-ias como eu te amei. Será possível gostar tanto de alguém só pelo que ela representa sem mais nada a não ser o seu corpo e alma. Será possível? Será possível amar mais do que uma pessoa ou mesmo tempo? Será possível amar alguém que se perdeu e que se manteve guardada durante anos? Será possível reencontrar o amor. Será que as feridas no ego têm alguma recuperação? Não gosto do mundo em que vivo. Não gosto das imposições e das aparências que são promovidas hoje em dia. Não gosto. As pessoas cada vez mais cultivam a falsidade. Um provérbio árabe ensina-nos a afastar daqueles que se referem aos outros negativamente, já que as vítimas somos nós assim que virarmos as costas. E o mais grave é que este tipo de comportamentos é contagioso. Queria regredir ao meu estado primário do ser. Queria amar e ser amado sem que nada mais fosse importante. E é tão difícil ser selvagem.


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