quarta-feira, 27 de junho de 2012

cry & rebirth & cry & rebirth & cry

Afastamo-nos um do outro com as lágrimas amargas marcando o trilho dos erros que cometemos ao longo destes 18 meses que me parecem uma eternidade. Não olhei para trás enquanto caminhava Belém fora rodeado por ordas de turistas naquele momento transparentes e voláteis. Não olhei para trás porque não se olha para trás para as coisas boas que tenho marcadas no meu espírito. A noite estava quentíssima contrastando com o gelo que sentia no meu espírito. Aproximei-me do meu carro com a esperança que o teu ainda lá estivesse. O lugar estava vazio. Afastamo-nos com um abraço quando a minha vontade foi fazer amor contigo. Chorei até a casa. Nessa noite não consegui pregar olho. As memórias boas suplantam as más, têm que suplantar. Não sei o que faça aos milhares de fotografias que tenho espalhadas nas molduras digitais cá por casa. Mas não posso continuar a encarar-nos com os olhares embevecidos com sempre tivemos. Não sei o que faça às tuas fotos ternas que tenho no iPhone. Não sei o que faça da minha vida sabendo que nunca mais compartilharei os teus abraços enquanto devorávamos filmes italianos antigos durante a tarde. Seria tudo mais fácil se nos tivéssemos separado zangados e com ódio um do outro. Não faz parte de nós, não faz parte de mim, nunca te conseguiria odiar. Como sabes, sou explosivo, disparato, digo alarvidades umas sentidas outras nem por isso, levo tudo à frente, mas no fundo sou incapaz de odiar quem quer que seja. Sou incapaz de fazer mal a quem quer que seja. Sou demasiado sensível para não me emocionar com a mais pequena injustiça que paire no meu espírito. Mas esqueço rapidamente e sou incapaz de guardar rancor. Nisso somos de facto diferentes. Não fico com as ideias presas num canto da mente quando aparentemente tudo já estaria resolvido. Não sei se é melhor ser explosivo ou rancoroso. Provavelmente o equilíbrio entre os dois. Não obstante, estamos os dois a milhas desse. Separar-me de ti amando-te como eu te amo não me faz de todo sentido. O amor não se resolve como comprando um novo cão quando o nosso velho bichinho de estimação partiu para a outra vida. Afastamo-nos um do outro contra a minha e tua vontade. Afastamo-nos porque somos demasiado estranhos, demasiado excêntricos, demasiado bizarros... e sobretudo porque pensamos demais. Vejo as pessoas vivendo vidas simples e felizes... Que sina promovi ao longo da minha vida para estar condenado a eterna solidão. Teria de re-iniciar a minha análise, quando estupidamente pensei que tudo no meu espírito era claro e controlável. Nada é controlável. Erro crasso. As pessoas, os meus amigos, os meus colegas vão começando e terminando relações com as lágrimas nos olhos e eu não fujo à regra. Mas que merda de vida promovemos hoje em dia. Não é um problema exclusivamente meu, exclusivamente nosso... Provavelmente nunca estamos satisfeitos. A sociedade de consumo estende-se até às relações e infiltra-as promovendo o descartável, o usa e deita fora. O amor está em promoção. Só durante 18 meses. É aproveitar ou largar. Termino com um majestoso FODA-SE ESTA MERDA TODA.

domingo, 24 de junho de 2012

when the phone rings

Quando o telefone toucou e não me atendeste decidi não mais te telefonar. Mas atendeste e conversámos... sobre nada. Disseste tudo com o teu silêncio transbordando palavras secas e cruas como se não me conhecesses, como se tratasse de uma qualquer chamada de inquéritos via telefónica. Os quais disseste logo não estar interessada em responder. Como se fosse essa a intenção de um telefonema. Por pouco não reconhecia a tua voz. Mas reconheci. Há timbres e sonoridades inesquecíveis que perduram para todo o sempre na nossa memória. Conversámos e nada disseste. Nem eu. Ficámos-nos por aqui, hoje como ontem. O telefone toucou e antes que o sinal de recusa desse sinais de vida ouvi a tua voz. Como gostei de ouvir a tua voz, ainda que a mensagem fosse obscura e cinzenta. Nada mais interessa, aliviei as saudades que tinha de te ouvir, embora soubesse que nada de bom terias provavelmente para dizer. Quando o telefone tocou e eu te pedi para passares a nossa música dos Temper Trap - Love Lost, disseste-me que o tempo do "quando o telefone toca" (programa memorável da rádio de outrora) já tinha passado. Agora se quiseres as tuas músicas vais para o YouTube e fazes as dedicatórias a quem bem entenderes. "Eu passo a música que bem entender e se não estiveres satisfeito podes ir à merda". É difícil ir a algum sítio quando já lá se habita há algum tempo. O telefone tocou e eu despertei. Acordei de mais um pesadelo. O vinho do Porto dá-me maus sonos. Venha um Absolut Vodka + Red Bull. PS: Alguém quer ir ao Lux hoje à noite???



quarta-feira, 20 de junho de 2012

old photos 2





Gosto de fotografia como gosto de música. Já aqui escrevi várias vezes a presença constante na minha vida da música... e também de fotografia. As fotos trazem-me à memória momentos como se estivesse a reviver os mais marcantes. Afinal essa é a sua verdadeira função. Sempre com banda sonora. Tantas vezes conversámos acerca de envelhecermos juntos. De estarmos unidos para todo o sempre. Como seria estar novamente sentado naquele tronco na Terra del Fuego quando eu tivesse 100 anos e tu 89. Mal sabíamos que mentíamos um ao outro e a nós próprios. Guardo no meu espírito aquele abraço quente envolvido por uma paisagem que nunca mais esquecerei. E que que vivi contigo. Foi sem dúvida a viagem da minha vida. Não voltarei à Patagónia sem ti. Nunca mais voltarei. Tantas coisas ficaram por dizer e por fazer. Como não soubemos gerir as adversidades das nossas vidas que podiam ter sido perfeitas a dois. Errei e senti na pele os teus erros. Não soube ultrapassar aquelas memórias ácidas com que destruíste a imagem impoluta que de ti tinha. Como eu gostaria de voltar atrás no tempo e proferir as palavras que proferi mas ao contrário e receber-te da maneira que tu ansiavas. Errei e nada posso fazer para o remediar porque estás longe. Gosto das fotos velhas embora nunca seremos fotografados de mão dada como gostávamos de andar Chiado acima eu de bengala e chapéu e tu de sobretudo negro. Foram 2 anos intensos em que vivemos sofregamente com momentos inesquecíveis. Para o bem e para o mal. Tudo o que fazíamos fazíamos intensamente. E como um fósforo que timidamente inicia a sua combustão explode em mil cores e apaga-se num cizento queimado, também nós vivemos a nossa relação. Choro. Choro muito e repito mais um ciclo de vida. Mais um ciclo de escritas. Mais um ciclo de desilusão. Por ti e por mim. Recordo aquela noite mágica na Confeteria Ideal em Buenos Aires. Apesar de não dançarmos um passo de Tango sentimos a paixão vivida por aquelas pessoas, nossas avós, que se amavam para a eternidade. Também nós jurámos amor eterno. Leio as tuas cartas e perco-me na fragilidade em que transformámos a nossa relação. Orgulho desmensurado. Dos dois. Argumentavas que a vida não são só viagens. Mas de facto os melhores momentos da minha vida vivi-os contigo em viagem. Talvez por estarmos os dois distantes desta realidade mesquinha que nos oprime. Se abrires o teu espírito verás que tenho razão. Ontem sonhei que estávamos novamente em Marrocos, recordei a explosão do Argana que só por sorte não nos levou a vida, recordei o medo imenso que tinha de te perder na Medina de Marrakeche, um pronúncio do medo imenso que sempre tive de te perder... em certa medida promovi a perda. Um espécie de eutanásia emocional. Desde há já algum tempo que aquele sentimento de "para a eternidade" se tinha perdido. Sentia de ti um distância atroz, sempre perdida na mágoa da tua outra esfera. Permitiste que interferisse na nossa vida pessoal. Apoiei-te sempre que pediste mas a pouco e pouco tornou-se insuportável. Não aceitavas nada que fosse contra o teu pensamento pré-estabelecido. Promovi uma morte que já há muito se vinha anunciando. Uma eutanásia verdadeiramente sentimental. Sabia exactamente qual seria a tua reacção às minhas palavras. No meu íntimo sabia que desaparecias para todo o sempre. E tu também o sabias. Esperei a janela para te ver chegar. Adormeci e quando acordei o teu carro já lá não estava. Até hoje.

old photos

old photos. cant stop looking. it remembers me the good old days that we had. when we were in love, in passion. When i phoned you all the time. I miss your voice so much, your eyes, your touch... Cant imagine a world without you... but i have to. You vanished completely without explanations. Small things that we do... that we say can be amplified and turn into a deep storm. I need your smile so much. Your thoughts... free from that repetitive cycle that i couldn´t stand anymore. I love your old photos in sepia, b&w... i have the green style of your wall on my mind... speranza... i hope never die.

terça-feira, 19 de junho de 2012

o meu fim

Chegou o meu fim. Sinto-o a cada minuto que passa. Nunca chega e quando chegar será inesperado, como todos os fins. Adormeço deitado no sofá onde tantas vezes adormecemos, só que agora estou sozinho. Agarro-me às almofadas salpicadas pelos pingos de líxivia que escorrem do tecto numa vã tentativa de limpar a minha alma ferida e poluta. Chegou o meu fim só que ainda não me dei conta. Acendo o lagarto escarlate trepando a parede sem fim. A sua luz suave acalma-me porque sei que o quererás de volta e talvez nesse dia os nossos olhos se cruzarão novamente. Chegou o nosso fim sem que nos apercebamos. As paredes tremem e ruiem à nossa volta. Os vidros caiem do 9ª andar e estilhaçam-se no meu corpo, cravam-se no meu crânio expondo todo o meu pensamento que se espalha pelo chão cizento de cimento frio. O sangue escorre-me atordoando-me os parcos minutos que ainda me restam. Chegou o meu fim e ao certo não sei quando ocorrerá. Recordei-te este sábado caminhando pela igreja onde nunca chegámos a entrar os dois. Mas de facto também nunca fui convidado. Chegou o meu fim no dia em que fui banido. Ao certo sem me dar conta do momento. Adormeço e deixo-me cair nos teus braços que me lançam neste abismo de vida terrena. Chegou o meu fim quando te libertaste e me mantiveste preso na indefinição do nosso estado. Tanto quanto sei, pode ter chegado o teu fim e eu continuo a teclar sem saber onde pairas. Talvez no Quénia, ou Ásia... Em qualquer lugar longe do meu olhar, mais ainda assim sempre próximo do meu coração. Chegou o meu fim quando de ti nada soube.

domingo, 17 de junho de 2012

O Roupeiro

Esvaziei o roupeiro para te receber. Continua vazio. Tudo o que fui modificando nunca foi reconhecido. Provavelmente nunca o seria. Quando não estamos bem connosco nada nem ninguém nos fará sentir em casa. E de facto esta nunca foi a tua casa. Ou pelo menos nunca a sentiste como tal. Esvaziei o roupeiro para te receber e até isso foi mal recebido. Diminuíste todas as pequenas grandes atitudes por mim tomadas como algo desprezável. Recebi-te numa casa que não era a tua, modifiquei hábitos, alguns bem enraizados outros nem tanto e tu continuaste sempre a ver o copo meio vazio. Quando não nos entregamos a uma relação todas as pequeninas coisas podem ser motivo de discórdia. Quando as ambas as personalidade são fortes as faíscas surgem. Se o gás nos envolve as explosões acontecem. Não obstante, contigo relevei atitudes e episódios que nunca teria conseguido passar por cima com mais ninguém. E talvez tenha sido essa a minha fraqueza. Quando certos pilares são abalados, por muito forte que seja uma personalidade o outro perde verdadeiramente o respeito pela pessoa com quem se compartilha uma vivência, perde o respeito pela relação e surge o desinvestimento. Sobretudo se olhando à sua volta essa relação fica aquém de tudo o resto. Se é sempre vista em segundo plano perante os amigos, a profissão, a família... Esvaziei o roupeiro para te receber, apaguei memórias, escondi fotografias e no entanto nada foi suficiente. A História não se apaga e não entendo bem a diferença entre ter um velho álbum de fotografias numa estante ou escondido num armário. Em ambos os casos está lá. Pode-se ou não promover discórdias com isso. Mas esse não é o verdadeiro problema. Esse reside em ti. Em nós. Esvaziei o roupeiro para te receber, na ingénua tentativa de não te perder. Mas à posteriori, percebi que na verdade nunca te tive. Não passei de uma experiência mal acabada. A pouco e pouco foste-te tornando cada vez mais impenetrável. Ou então tudo aquilo que eu pensei ser transparência nunca existiu de facto. Por muito que me custe a aceitar já que isso corresponde ao meu confronto com a minha própria incapacidade para avaliar as pessoas. Deveria ter fugido no momento certo, mas relevei, e no entanto demonstraste bem que os teus limites eram diferentes dos meus. Esvaziei o roupeiro para te receber e ele continua vazio numa vã esperança de entendimento que não surgirá mais. Aproveitaste uma brecha para te pores ao largo e fugires de vez de algo que nunca quiseste verdadeiramente. Olho para trás e sinto saudades da paixão eloquente que contigo quis viver. Que quis sentir. Terei sido só eu. Entristece-me às lágrimas pensar que sim. Também colocava tudo em segundo plano, mas por ti. Os riscos que corri. Esvaziei o roupeiro para te receber e deixo a porta aberta  para um dia quem sabe te receber...

sábado, 16 de junho de 2012

xampu

Fecho os olhos enquanto a água tépida me escorre pela face... quase fria. Sorri espalhando o  shampoo de uma só vez envolvendo todo o cabelo. Sorri ao recordar a forma terna com que o depositavas em concha na palma da tua mão e o agarravas aos bocadinhos com a ponta dos dedos antes de o espalhares pelos teus longos cabelos lisos. Pequenos pormenores que te caracterizavam e que ainda me fazem sorrir. Recordei o prazer que tinhas em sentir a água a ferver deslizando sobre a tua pele mantendo-me à margem correndo o risco de ser escaldado. Recordo a sintonia de movimentos quando tomávamos duche a dois e como isso ironicamente se foi perdendo. De facto só os pormenores são realmente importantes. O carinho que guardo das nossas boas recordações é difícil de transcrever, não há prosa nem retórica suficiente para materializar as saudades que sinto da nossa vida a dois, que como o teu shampoo se foi fraccionando, transformando-se em espuma e escorrendo cano abaixo. Naturalmente recordo todas as nossas músicas, filmes, serões, conversas, comunhão, vivências ao ar livre, na praia, no campo, na serra, nas viagens... as saudades que tenho de me banhar contigo no nosso secret spot e sentir a sombra caminhar rapidamente com o som das cigarras ao longe e os cânticos das gaivotas à nossa volta. Recordo a dissecção meticulosa que executavas na comida deixando aquilo que não te interessava na borda do parto, à margem... Embora tente negar a mim mesmo e vá resistindo a telefonar-te, ver-te, ouvir-te... de facto tenho saudades tuas, daquilo que já foste. As tuas fotografias continuam por cá em slide show nas molduras led negras que habitam esta casa mais triste, mais vazia. Fecho os olhos e ouço com atenção a banda sonora do Anjos e Demónios, um dos últimos filmes que vimos enroscados no sofá cizento-tabaco. O último de Fellini ironicamente ficou a meio, também ele retratando um amor mal-vivido. Nunca o irei ver novamente até ao fim... pelo menos sem ti. Por isso, parece-me que fechei definitivamente o meu ciclo de cinema italiano do século passado. E como eu gosto de cinema italiano. De facto, cada vez mais a minha relação amor-ódio em relação a Itália é patente. Aprecio imenso a cultura italiana, passei dias inesquecíveis em Itália, em Roma... e no entanto tantas farpas à posteriori de lá vieram. Recordo o Morango-Côco com que me viciaste e dou comigo na Santini derretendo-me em memórias que parecem cada vez mais distantes. Que circolo degli artisti se transformou a nossa vida, caídos no chão, ao som de Clash, procurando La Gafas, ainda sem a exclusividade das que compraste mais tarde. Tantas recordações que poderia continuar a descrever, tantos pequenos pormenores, tantas vivências e no entanto não soubemos preservá-las condignamente. E digo-o no plural porque não há preto no branco, só cinzento... Quem sabe um dia. 




o meu fado

de facto... nem tudo se consegue controlar.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

incongruências

Mantenho-me atento perante as incongruências da vida, das pessoas, dos factos, de tudo o que nos rodeia. A condição humana é incongruente à partida. As pessoas são incongruentes com aquilo que defendem, praticando actos desonrosos para a própria condição humana. De facto a sociedade actual alimenta os monstros dentro de nós. O cinismo e a hipocrisia abundam naquilo que deveria ser transparência e sinceridade. As pessoas, mesmo as ditas amigas, são capazes dos sorrisos mais obscuros enquanto nos dilaceram o dorso com o punhal da hipocrisia. O pior, mesmo nós, envolvidos por todo um ambiente cinzento e podre somos capazes de algum cinismo algures no tempo e no espaço. Isso não é mau quando temos capacidade de auto-crítica e conseguimos evitar comportamentos deletérios para com os nossos semelhantes. O mau é quando esses comportamentos são regra e não a excepção. Quando as pessoas se movem exclusivamente pela maldade, enquanto pregam o bem - hipocrisia - e a sociedade está pejada desses comportamentos inquisitoriais. Não há mal ou bem, não há preto ou branco, há uma grande área cinzenta onde nos movemos. Uns dirigem-se em direcção à luz, outros preferem o caminho da negritude. Não obstante, será que alguma vez conseguiremos sair do cinzento. A História ensina-nos que não. Sejamos humanos ou animais, na realidade a tendência para espezinharmos os mais pequenos e adorarmos os mais dotados é grande. No entanto nem sempre os mais dotados são realmente mais dotados. Por vezes vencem com base na força e impõem-se com base na força. E os pequenos poderes passam a grandes poderes. E como as pessoas adoram e veneram o poder. As incongruências abundam,  desde casa, até aos locais de trabalho, grupos de amigos, família, sociedade em geral. Mesmo os irmãos são capazes dos crimes mais horrendos em prol do materialismo. As notícias acerca de homicídios entre irmãos por heranças são inúmeras. É dramático verificar quando um representante da nação, que pela sua profissão de confiança é suspeito de homicídio por questões monetárias. A sociedade de facto está podre e doente. Provavelmente nunca foi saudável. A sociedade é constituída por homens e estes de facto na generalidade não são de confiança. As pessoas, homens e mulheres, traiem-se, magoam-se, omitem, dissimulam em prol do seu próprio umbigo. Penso que não deverá animal mais solitário que o ser humano, cometendo a hipocrisia de viver em sociedade. Que incongruência. Sinto-me triste cada vez que saio de casa e tenho que encarar este mundo de merda que nós próprios ajudamos a desenvolver.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Morte

A morte e um misterio em si. As endorfinas aliviam-na e muito provavelmente mesmo nas mortes mais penosas nao sera atroz e sofredora. Ou entao e, mas fica no segredo de quem ja passou a fronteira da vida. A morte a posteriori e sofredora para os que ainda nao a vivenciaram, embora seja so uma questao de tempo. A verdadeira morte surge quando todos os que nos conheceram se finarem ou ficarem senis. Enquanto nos mantivermos nas memorias estaremos vivos. E uma questao de duas ou tres geracoes para nos passarmos definitivamente para a obscuridao deste universo. A morte e fisica, mas pode tambem ser emocional. Quando uma relacao termina e a pessoa com quem se compartilhou momentos e emocoes da nossa vida desaparece, ficam as memorias. Ate que alguem as substitua e tudo pareca cada vez mais distante e longinquo. Ate ao momento em que tudo se dilui na obscuridade da nossa vida ainda terrena. Ficam por ca alguns objectos, mas ate esses perdem o sentido e o momento de quando foram oferecidos ou recebidos. A morte tal como a incapacidade de se manter uma relacao ate a morte permanece um misterio em si. Mais obscuro ainda e o desaparecimento de alguem que deliberadamente se eclipsa, se esfuma, deixando o outro num limbo, numa corda bamba. Talvez seja ainda mais sadico que a propria morte de uma relacao. E a manutencao de uma nao-relacao. Fiquemos-nos por aqui. Mao-Mao 1975-2012

domingo, 3 de junho de 2012

168ª hora


Ao fundo o mar. Espreito pela janela suja e antevejo o dia quente que se aproxima. O Sol põem-se deixando um rasto marmoreo no horizonte. As luzes piscam pela maresia que que nelas poisa. Estás numa ilha longínqua e de ti nada sei. Não te encontro, mas na realidade deixei de te procurar. Não é possível procurar perpetuamente um amor errante. Pareces uma figura de um postal antigo, em tons sépia, encardido e encalhado num expositor de uma loja que morreu no tempo. Seguro o cartão amarelado e endurecido pela exposição às intempéries. Vejo-te numa ilha distante, rodeada pela floresta luxuriante acenando lentamente num adeus que há muito estava presente no teu espírito. Fotografas-me em segundo plano. Apareço desfocado no teu projecto de vida. É inevitável, a luz não se capta da mesma maneira. Ao fundo o mar já só se adivinha. A noite caiu. Vejo intermitentemente a luz verde do Bugio. Assinala o bombordo. A segurança da costa e dos pés bem assentes na terra. Tenho ultimamente, sempre que posso, caminhado junto ao mar. Perto de ti sem que tu dês conta. Leio as divagações psicanalíticas floreadas sob a forma de ficção e revejo-me. A verdade real é a verdade vivida, dizia Nietzche. Com razão. Tudo o resto são artimanhas da nossa mente distorcida. Não se pode apoiar incondicionalmente ninguém, nem o nosso maior amor. Sobretudo quando o mesmo não se demonstra. Não reconheço honestidade intelectual aqueles que nos dizem exactamente o que queremos ouvir. Torna-se demagógico e paradoxal em relação à pureza dos sentimentos que devem unir duas pessoas. Se assim não o é, impossibilita a procura perpétua de um amor errante. Passaram-se 168 horas desde a ultima vez que nos vimos. Cada vez mais claro no meu espírito que terá sido o nosso último ponto de intersecção e divergência. Mas não houve um simples minuto em que em ti não pensasse. Sigo o teu exemplo e recordo o local onde quase fomos assaltados e nos soubemos proteger um ao outro. Nada mais apropriado.